ESTA CRÓNICA FOI PUBLICADA NO BLOG REFLEÇÃO PORTISTA
Quarta-feira,
30 de Maio de 2012
Ontem à noite, logo a seguir ao telejornal, a RTP
brindou o país com uma extensa entrevista efetuada a Luís Felipe Scolari,
entrevista essa que no dia/horas anteriores andou a promover à custa do
anti-portismo nacional. De facto, o chamariz desta entrevista foram as
“revelações” de Scolari acerca das razões que o levaram a não convocar Vítor
Baía para a Seleção Nacional.
E que explicações foram essas?
Bem, Scolari contou uma história que, segundo ele, se
terá passado na véspera de um Belenenses x FC Porto, supostamente o primeiro
jogo a que assistiu como selecionador de Portugal (no início de 2003):
“No dia anterior [ao Belenenses x FC Porto], tive
um encontro com as lideranças do Porto, técnico e presidente”
“Disseram-me que o Vítor Baía não estava mais nos
planos do clube, não jogaria mais e que estava em conflito com o seu treinador
[José Mourinho] e com a direção”
“Foi o presidente do Porto que me disse isto. A
partir daí passei a olhar com outros olhos para o Vítor Baía”
“Quem jogou esse jogo [Belenenses x FC Porto] foi o
Nuno Espirito Santo”
“Um mês ou dois depois [o Vítor Baía] voltou a
jogar no Porto”
O jornalista da RTP ouviu estas afirmações impávido e
sereno, mas o comum dos adeptos não precisa de ter grande memória para se
lembrar de outras explicações apresentadas por Scolari (para o afastamento de
Vítor Baía da seleção nacional). Primeiro, e durante anos, foi a tese da opção
técnica.
5 de Setembro de 2008. No fecho do Fórum de
Treinadores de Elite da UEFA, em Nyon, na Suíça, Luiz Felipe Scolari (na altura
treinador do Chelsea) afirmou:
“As escolhas que fiz na época [em que era
selecionador de Portugal] e as que faço agora são de acordo com as minhas
convicções. Já falei 120 vezes a mesma coisa, que foi por opção
técnica. Quem quiser que entenda, se não quiser que se dane.”
No entanto, em Dezembro passado a razão principal
deixou de ser técnica e passou a ser de balneário, com o ónus pelo afastamento
de Baía a ser atirado para cima de Gilberto Madail.
30 de Dezembro de 2011. Em resposta a declarações de
Gilberto Madail, acerca do afastamento de Vítor Baía da seleção nacional, Acaz
Felleger, assessor de Luís Felipe Scolari, afirmou em entrevista à RTP:
“Scolari perguntou a Madail sobre o Vítor Baía e
foi-lhe dito pelo presidente que não era um bom atleta de balneário, que não
criava bom ambiente”
Uns dias depois, Madail refutou completamente estas
declarações: “Surpreenderam-me essas declarações do senhor Scolari. Eu seria
incapaz de me intrometer em algo que é da responsabilidade do selecionador. E
ele sabe muito bem que nunca tive essa conversa com ele.”
Finalmente, nove anos e meio após ter sido contratado
pela FPF, Scolari chegou à mãe de todas as explicações e aquela que,
indiscutivelmente, mais agrada ao país desportivo: o principal culpado pelo
afastamento de Baía foi o maquiavélico Pinto da Costa!
Mas será esta explicação mais verosímil que as
anteriores?
É fácil constatar que as afirmações de Scolari estão
cheias de falsidades.
14 de Dezembro de 2002. O presidente da FPF, Gilberto
Madaíl, completou 58 anos e Scolari veio a Lisboa para assinar contrato como
selecionador de Portugal. No evento, que teve ampla cobertura mediática (e foi
transmitido em direto no sítio da FPF na Internet), esteve presente Luís Filipe
Vieira, na altura presidente da SAD do slb.
19 de Janeiro de 2003. Disputou-se, no Restelo, o Belenenses x FC Porto, da jornada 18, do
campeonato 2002/03.
Será que nesse dia Scolari já estava em Lisboa a
trabalhar como selecionador?
Será que na véspera (18/01/2003) se encontrou com o
treinador e dirigentes do FC Porto? Onde?
Convido os jornalistas sérios a investigarem, mas uma
coisa é facílima de apurar (eu demorei dois minutos): quem defendeu a baliza
dos dragões nesse jogo não foi Nuno Espirito Santo, mas sim… Vítor Baía! (o tal
que, segundo Scolari, lhe foi dito que não jogaria mais pelo FC Porto, porque estava
em conflito com o seu treinador e com a direção)
É verdade que Vítor Baía teve um desentendimento com
José Mourinho num treino à porta fechada, mas isso foi no dia 22 de Setembro de
2002 e, após ter sido colocado a treinar à parte, o conflito ficou sanado no
dia 17 de Outubro de 2002 (três meses ANTES do Belenenses x FC Porto referido
por Scolari).
Na realidade, Baía voltou à baliza do
FC Porto, não quando
o Scolari disse na entrevista à RTP (“um mês ou dois depois [do Belenenses x FC
Porto] voltou a jogar no Porto”), mas muito antes do devoto de Nossa Senhora de
Caravaggio ter posto os pés em Portugal. E, para desgosto do clube de fans do
Ricardo, foi com o Vítor na baliza que o FC Porto venceu o campeonato, a final
da Taça de Portugal e a Taça UEFA dessa época (2002/03), já para não falar na
Liga dos Campeões no ano seguinte.
Pois é, querendo, apanha-se mais depressa um mentiroso
do que um coxo. O problema é que, neste caso, isso estragava os títulos e
manchetes anti-Porto que esta entrevista a Scolari proporcionou.
P.S. Que Scolari, para ser popular e para agradar aos
seus amigalhaços portugas, avance com explicações mirabolantes, desdizendo-se a
si próprio, é algo que não me surpreende minimamente. Agora, que um jornalista
cruze o Atlântico para ir a São Paulo entrevistar Scolari, ouça estas
afirmações e nem sequer o confronte com as contradições evidentes e diferentes
“explicações” anteriores, é algo que remete para outro tipo de considerações.
Em primeiro lugar, o que motivou a entrevista ao
ex-ex-selecionador de Portugal nesta altura? O ex-selecionador (Carlos Queiroz)
também vai ser entrevistado ou isso não convém?
Em segundo lugar, tendo a RTP um correspondente no
Brasil, qual a necessidade de enviar propositadamente um jornalista de Lisboa,
algo que implicou uma viagem de 16 mil quilómetros (ida e volta)? Pelos vistos,
e apesar da Troika, na televisão pública continua a haver oceanos de dinheiro
para esbanjar nestas “missões especiais”…
Em terceiro lugar, porque razão foi escolhido o
jornalista Hélder Conduto? Por estar habituado a confraternizar
com treinadores de futebol? Por ser amigo de Scolari desde os tempos em que o homem das bandeirinhas
fazia campanhas de milhões para o BPN? Por, em entrevistas anteriores, já ter
mostrado uma elevada capacidade para “conduzir eficazmente” entrevistas polémicas que envolvam insinuações ou
acusações a elementos do FC Porto?
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